Paremos de correr atrás de pessoas, situações e escolhas que sabemos que podem nos machucar. Evitemos transmitir o compromisso que temos com nós mesmos – de sermos pessoas as quais amamos – à influência de algo desconhecido. Fujamos de problemas que não nos permitem voltar à superfície quando imersos em dor.
Há algum tempo, conversando com alguns amigos, dei-me conta de uma patologia social que está presente em quase todas as pessoas que ainda não conheceram a si mesmas: a autossabotagem. A partir do momento em que conseguimos identificá-la nas nossas vidas, percebemos a quantidade de escolhas, atitudes e caminhos seguidos que nos privam de equilíbrio, paz espiritual e, enfim, a tão almejada felicidade.
Quem nunca ouviu de outros – ou de si mesmo – “não adianta, eu sou assim”, “eu já tentei de tudo, mas nunca vou mudar”, ou ainda, “eu não gosto disso em mim, mas já me conformei”. Para mim mesma – que já falei diversas vezes – e para todos que insistem em aceitar o mínimo que podem ser, vos digo: somos outros todos os dias. Temos a oportunidade de mudar quem somos e o que não gostamos em nós mesmos diariamente, e não há prova maior dessa escolha do que apenas estarmos vivos.
E digo a mim mesma, ao acordar: seja a pessoa com quem você gostaria de estar junto, a pessoa de quem você gostaria de ser amiga e a pessoa com a qual você gostaria de se envolver.
Percebo nas pessoas com as quais eu me relaciono uma grande dificuldade em assumir a responsabilidade pelas próprias decisões, palavras e reações. Isso acontece porque diversas vezes atribuímos a uma força maior todos os porquês que deveriam ser questionados à nós mesmos, por nós mesmos. Dessa forma, por nos conformamos em nunca sermos perfeitos e insistirmos em cometer erros – os quais muitas vezes, já sabemos que o são -, encaramos a nossa própria “personalidade” como algo indiscutível, inerente e distante do que admiramos.
Com certeza você já olhou para alguém e pensou “como ela consegue levar a vida de uma forma tão leve?” ou “como eu gostaria de ser um pouco como ele…”.
Bem, você pode.
A vida dessas pessoas não necessariamente é mais fácil ou até mesmo diferente da sua, mas elas procuram alcançar, a cada dia, um nível de satisfação com quem são, com seus defeitos e qualidades, no qual você também deveria estar tentando chegar. E não é fingir ser alguém que você não é para que os outros te vejam dessa forma, é ser exatamente quem você quer ser para si mesma. E amar isso. E sentir. E viver.
Segundo o povo iogue, existe um quarto nível de consciência, a consciência pura e inteligente, chamada de turiya. Sabemos que atingimos o nível de turiya quando nos encontramos em uma experiência de constante contentamento. Alguém que vive em turiya não é afetado pelos humores inconstantes da mente, não teme o tempo ou é prejudicado pela perda.
Não quer dizer que a vida não terá obstáculos, que sempre acordaremos lindos, amáveis e com um sorriso no rosto, mas a verdade é que muitos de nós – mas não todos, e excluo inteiramente as pessoas que têm depressão – escolhemos, sim, estarmos bem ou não. Não felizes, mas bem. Quando nos permitimos ficar bem, em harmonia, mesmo quando infelizes, abrimo-nos para que a felicidade esteja presente de novo; torna-se consequência. A partir do momento em que nos privamos dos pensamentos que podem fazer mal, nos livramos daquele parafuso que entramos quando estamos tristes, confusos ou desesperados e percebemos que – olha, só! – temos controle sobre nós mesmos.
A autossabotagem acontece quando não nos damos conta dos nossos erros e os cometemos diversas outras vezes, porque achamos que não temos controle sobre as nossas próprias ações. Porque achamos que sempre seremos a pessoa que cometeu os mesmos erros, quando, na verdade, crescemos a cada segundo e quem somos ontem, não é mais quem somos hoje. A nossa essência influencia na forma com a qual escolhemos chegar onde queremos, mas não no que queremos por si só.
A culpa segue a mesma lógica. Culpamo-nos e arrependemo-nos de momentos passados porque esquecemos que não somos mais quem éramos antes. Esquecemo-nos que essa mudança não é um processo incontrolável, mas acontece de acordo com as pequenas escolhas do cotidiano. Escolhas essas, que dizem respeito a fazer o que nos faz bem, a nos envolver com quem nos acrescenta amor e paz, a ir em lugares que realmente queremos ir, a não nos forçarmos em encontrar uma suposta felicidade que, na verdade, é alcançada enquanto a buscamos.
Evitemos essa sabotagem a qual nos submetemos. Paremos de correr atrás de pessoas, situações e escolhas que sabemos que podem nos machucar; evitemos transmitir o compromisso que temos com nós mesmos – de sermos pessoas as quais amamos – à influência de algo desconhecido; fujamos de problemas que não nos permitem voltar a superfície quando imersos em dor.
Dê-se liberdade para ser quem você quer ser.
Sinta-se seguro com quem você é.
Seja.